TRANSTORNO BIPOLAR: O QUE É "DEPRESSÃO BIPOLAR"?






            “Já passei por três Depressões, mas o médico disse que eu sou bipolar...”
A expressão Depressão Bipolar não favorece uma idéia instantânea do que possa significar. Afinal, o que haveria de bipolar em um estado no qual se sente tão pra baixo, tão sem saída, sem ver graça nas coisas que antes faziam sentido em nossa vida? Neste texto, escrevemos Depressão com “D” maiúsculo para diferenciar a patologia do sentimento de tristeza, que todos sentimos em várias situações da vida. Sobre o quadro clínico da Depressão há um post específico neste blog.
Em Transtorno Bipolar: a questão do diagnóstico, enfatizamos como o diagnóstico de Transtorno Bipolar (TB) vem sendo aplicado a muitas pessoas que, antes, eram vistas como deprimidas e que, mais recentemente, passaram a ser diagnosticadas e medicadas como “bipolares”. Nesses casos, após considerar várias características do quadro clínico atual e do histórico do paciente, faz-se o diagnóstico de uma fase depressiva do Transtorno Bipolar. Daí chamar-se a Depressão de “bipolar”.






O DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNO BIPOLAR
 
O diagnóstico de Transtorno Bipolar é feito a partir da presença de um conjunto de critérios clínicos padronizados. Além de uma ou mais fases de depressão, deve haver a ocorrência de pelo menos um episódio de mania, ou de hipomania, ao longo da vida.
 
Mania é uma expressão da Psicopatologia que inclui, ao longo de pelo menos sete dias, uma combinação dos sintomas abaixo. Formas mais brandas são chamadas de hipomania.


*      Elevação do humor (exaltação, alegria, euforia,irritabilidade, hostilidade)
*      Diminuição da necessidade de sono
*      Aceleração do pensamento, com muitas idéias e planos inusitados
*      Fala rápida, com pressão para falar, com freqüentes mudanças de assunto
*      Hiperatividade, com aumento da energia
*      Idéias de grandeza, com auto-estima e otimismo exagerados
*      Desinibição, indiscrição, maior interesse sexual
*      Impulsividade, gastos exagerados


Os pacientes acometidos por TB passam muito mais tempo deprimidos do que na fase de “euforia”. Antes do primeiro episódio maníaco/hipomaníaco, pode haver vários períodos de Depressão. Os longos períodos de Depressão, somados ao difícil reconhecimento de fases hipomaníacas ocorridas no passado, retardam o correto diagnóstico e o tratamento apropriado. Em decorrência, uma parcela significativa de pessoas recebe, inadequadamente, o tratamento com antidepressivos. Esses, além de não controlarem a crise, podem desencadear e agravar novos episódios da doença. Tal situação leva os médicos a procurar, junto a seus pacientes acometidos por Depressão, sinais presuntivos de TB.
 

A DEPRESSÃO BIPOLAR É DIFERENTE DA UNIPOLAR
Ocasionalmente, o termo “unipolar” é usado para enfatizar que não se supõe um TB subjacente ao estado depressivo. A Depressão “bipolar” geralmente é uma fase do Transtorno Bipolar tipo 2, que é a forma mais freqüente de TB. Caracteriza-se por episódios curtos de hipomania (de um a quatro dias, até de poucas horas), além de fases de Depressão. Vários estudos de seguimento acabaram por sugerir uma série de características que diferenciam a Depressão Bipolar da Unipolar:

Características
Depressão Bipolar
Depressão Unipolar
Modo de início
Abrupto
Lento
Início do primeiro episódio antes dos 25 anos
Freqüente
Ocasional
Vários episódios de alteração do humor
Muito Frequente
Frequente
História familiar de Transtorno Bipolar
Frequente
Raro
Temperamento hipertímico (eufórico, energético, falante)
Frequente
Raro
Outros problemas psiquiátricos concomitantes
Muito freqüente
Freqüente
Aumento do apetite
Frequente
Raro
Intensa sensação de peso no corpo e nos membros
Frequente
Raro
Excesso de sono
Frequente
Raro
Histórico de tentativa de suicídio
Muito freqüente
Freqüente
Sintoma psicótico
Frequente
Ocasional
Labilidade do humor
Frequente
Ausente
Padrão sazonal (ocorrência nos mesmos períodos do ano)
Ocasional
Raro
Hipersensibilidade ao que interpreta como rejeição
Frequente
Raro
Estados mistos (presença de sintomas de hipomania)
Frequente
Ocasional
Não há melhora com os antidepressivos usuais
Muito freqüente
Ocasional
Antidepressivos induzem mudança abrupta para (hipo)maníaca
Muito frequente
Ocasional
Em uma pessoa deprimida, nenhum desses sintomas, individualmente ou agrupados, define TB, mas sua presença exige investigação cuidadosa a respeito de antecedentes de (hipo)mania. Por outro lado, devido às diferenças esboçadas na tabela acima, a International Society for Bipolar Disorders (ISBD) sugere que a Depressão bipolar seja feita sob um caráter probabilístico, dispensando-se a detecção de episódios prévios de elevação de humor. Por que essa recomendação? A fim de se iniciar, mais precocemente, o tratamento adequado para um tipo de Depressão que, muito provavelmente, é a Depressão do TB.


ENTÃO O MEDICAMENTO PRECISA SER DIFERENTE...?
Sim. Feito o diagnóstico de TB tipo 2, não seria prudente iniciar o tratamento exclusivamente com um antidepressivo. As diretrizes de tratamento das principais organizações internacionais recomendam que a Depressão bipolar seja tratada com um estabilizador de humor (lítio, lamotrigina, quetiapina, divalproato), isoladamente, ou combinado a um antidepressivo, sendo esse último usado pelo menor tempo necessário. Se usados isoladamente, os antidepressivos podem induzir uma passagem abrupta da Depressão para estados de mania ou estados mistos, ou mesmo desencadear uma fase de ciclagem rápida, com muita instabilidade de humor e com maior risco de suicídio.


Ainda que não sejam a “última palavra”, tais diretrizes procuram organizar o grande volume de informações publicadas em artigos e livros, oferecendo ao clínico uma sequência hierárquica de etapas decisórias no tratamento do TB [1].
O tratamento da Depressão Bipolar insere-se na abordagem terapêutica mais ampla do TB e não se resume ao uso de medicamentos. Sobre o diagnóstico e o tratamento do TB, há outras informações neste blog.

Veja neste blog:

Temas relacionados ao Transtorno Afetivo Bipolar poderão ser lidos nos seguintes posts:    
TRANSTORNO BIPOLAR: A QUESTÃO DO DIAGNÓSTICO                                                                                                            
TRANSTORNO BIPOLAR: O QUE É “DEPRESSÃO BIPOLAR”?                                                                                                      
TRANSTORNO BIPOLAR: AS BASES DO TRATAMENTO                                                                                                                 
TRANSTORNO BIPOLAR: A FAMÍLIA LIDANDO COM A CRISE                                                                                                     

Sobre depressão, veja os posts:                                                           
                                                                                                                                           
DISTIMIA: QUANDO O MAU HUMOR É DEPRESSÃO                                                       
DEPRESSÃO: TRATAMENTO MEDICAMENTOSO                                                            
DEPRESSÃO: COMO A FAMÍLIA PODE AJUDAR                                                              
DEPRESSÃO: LONGAE SEM MELHORA                                                                          
DEPRESSÃO COM “D” MAIÚSCULO                                                                                 

Em outro conjunto de posts, há informações sobre como lidar com crises de pânico e insônia:
                                                                                                                                                              
TRANSTORNO DEPÂNICO E AGORAFOBIA                                                                                                                                     
PARA ENFRENTARO STRESS: RESPIRAÇÃO DIAFRAGMÁTICA                                                                                                  
PARA ENFRENTAR O STRESS: RELAXAMENTO PROGRESSIVO                                                                                                 

Três posts podem ser úteis para pessoas que tem o hábito de fumar:
                                                                                                                    
TABAGISMO (1): NÃO CONSIGO PARAR DE FUMAR                                                   
TABAGISMO (2): HÁ REMÉDIO PARA PARAR DE FUMAR?                                            
TABAGISMO (3): DICAS AO PARAR DE FUMAR                                                         

Para saber mais sobre transtornos mentais e seus tratamentos, visite o blog: 




[1]  Entre as diretrizes mais prestigiadas encontra-se a do Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT), elaborada em colaboração com a International Society for Bipolar Disorders (ISBD), que pode ser encontrada em Yathan LN et al. Bipolar Disord 2013;15(1):1-44.